domingo, 19 de fevereiro de 2012

PORTUGAL PRECISA DE UM GOVERNO QUE O TIRE DO BURACO E NÃO UM QUE O JOGUE NA TUMBA





Nunca imaginei que Portugal chegasse a esse estado deplorável que experimenta, gerado por uma crise econômica e financeira com gravíssima repercussão social. Hoje, o país registra um nível de desemprego de 14%, elevadíssimo se tratando de uma nação com 10 milhões de habitantes e uma força de trabalho em torno dos 5 milhões de pessoas. Ou seja: 700 mil estão desempregadas. Dados oficiais dão conta de quase 12.300 famílias sem meios para pagar as prestações da casa própria perdendo os imóveis para os bancos. Os portugueses manifestam-se nas ruas cansados de tanto sacrifício.

Pela experiência brasileira, conhecendo bem e in locco os estragos que o FMI faz num país que a ele recorre, o que é um contra-senso, pois esse Fundo Monetário Internacional foi criado para exatamente socorrer os países em dificuldades e o que sempre faz - não foi diferente no Brasil - deixa-os à míngua, como se diz (ou dizia) por aí, gritando: Ó Tio, Ó Tio.

Costumo dizer que a situação do Brasil quando esteve sob o jugo implacável e repressor do FMI foi muito ruim, mas este país tem um tamanho continental pronto a gerar riquezas de toda a ordem, além de possuir ouro, diamantes, muito petróleo por isso saiu da aba dessa diabólica instituição, tornando-se, inclusive, credor dela. 

Tenho certeza absoluta e a história comprova a minha afirmação, que o Brasil não saiu da aba do diabôlico FMI antes, mesmo apesar da dívida astronomicamente elevada, principalmente, durante o famigerado governo militar de 1964 a 1985, porque o governo não tinha interesse nisso e assim mantinha uma política econômica canhestra e repelia todas as tentativas de 

A eleição de Lula - da Silva, como é conhecido em Portugal - deu um fim a essa farra do FMI no Brasil. Ele pagou o que devia e determinou que as grandes encomendas das estatais, como, por exemplo, da Petrobras, navios, plataformas, sondas perfuradoras - a Petrobras acabou de encomendar mais 26 sondas ao mercado nacional - fossem produzidas no país e essa determinação aqueceu a economia em menos de um ano.

Nos governos do PSDB, de Fernando Henrique, esses equipamentos eram importados do exterior, sob o argumento de que ficavam mais baratos do que se fossem produzidos no Brasil. De fato, mas os estaleiros e a indústria nacional estava se deteriorando dia a dia e o desemprego no setor, e nos que dele dependiam, aumentando.
Além disso, os governos dos Fernandos: Collor de Mello e Henrique Cardoso entregaram por míseros patacos empresas estatais valiosíssimas, como a Vale do Rio Doce e a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e a Embraer, entre outras, em programas de privatização que prejudicaram e muito o Brasil.

Já Portugal, sem os recursos de sua ex-colônia tem, com sua economia extremamente debilitada, e a troika pressionando o país a tomar medidas recessivas extremamente duras - apesar de conhecer muito bem resultados catastróficos dessas exigências -, está, no momento, sem alternativas que aliviem a grave situação atual.

Os motivos são simples: ao longo dos anos, os grandes e poderosos da UE, com a egoísta e prepotente Alemanha no comando, naturalmente, sempre pensando em se dar bem - e está se dando muito bem, pois, foi o único país da UE a registrar, em 2011, aumento do PIB, em 2%, percentual muito elevado diante da crise instalada no continente - trataram de reduzir criminosamente à ínfima espécie a economia portuguesa, em troca de rios de dinheiro que desaguavam em Lisboa e eram espalhados através de obras, boas, mas faraônicas e, em sua maioria, estradas - algumas delas só necessárias duas décadas na frente, como tão bem define meu sobrinho, engenheiro civil, que inclusive trabalhou em algumas dessas obras.

Lembro-me muito bem da ordem estúpida, criminosa, repugnante do comando da UE para que os portugueses queimassem uma certa quantidade, não me recordo quanto, de vinhedos, determinação que os idiotas dos governantes da época acatavam sem pestanejar, mesmo sabendo que estavam reduzindo a economia nacional, mas, o que lhes interessava eram os euros vindos "a fundo perdido" que oportunizavam e materializavam as suas mordomias e os seus desejos ocultos de enriquecimento oculto.

Pela experiência daqui deste lado do Atlântico, não vejo como Portugal poderá se livrar, no momento. A saída seria uma moratória temporária sempre muito cara à nação que a decretam, mas que poderia aliviar a pressão econômica, financeira e social, mas que o atual governo e o presidente jamais aceitariam.

Há o exemplo da moratória feita pela Argentina, há alguns anos, com que conseguiu, apesar da grita e ameaças do FMI, despressurizar significativamente a economia, fugir das exigências recessivas do FMI e equilibrar as contas internas com o dinheiro que teria de enviar mensalmente para o fundo.

Quando a situação melhorou internamente, a Argentina conseguiu renegociar de forma favorável a dívida que continuou pagando sem a pressão anterior que estava levando os argentinos à miséria total. 

Sentado num restaurante, assisti a uma situação - humilhante para povo argentino e para qualquer outro, sem dúvida -, em Buenos Aires, na famosa Calle Florida, um senhor de seus 55/60 anos, de terno e gravata (fato) vasculhando uma lixeira à procura de comida, imagem que não esqueço.

É essa a ajuda que o FMI dá aos países? É, sim. O poder econômico-financeiro mundial já causou muita miséria, muita desgraça onde pôs os pês e as mãos aniquilando o pouco que restava das nações em declínio que "ajudaram".

A Grécia é a prova dessa canalhice que o poder financeiro e político do FMI causa onde entra. Desestabilizou literalmente a economia grega e colocou a nação em pé de guerra, cansada de tanta humilhação. Está fazendo o mesmo com Portugal: o desemprego atingiu 14% de pouco mais de 5 milhões de pessoas economicamente ativas, das quais 31% são jovens até 25 anos. Isso é muito grave. O alerta vermelho está ligado, mas o governo parece ou é daltônico.

A perspectiva real é de agravamento do quadro, devido à ausência de novos investimentos, ao avanço do desemprego, às reduções criminosas dos índices de credibilidade de Portugal - já estava no lixo e foi rebaixado ainda mais a -lixo. O país precisa de ser ajudado a sair da crise e não empurrado pelas costas para a tumba.

É triste e lamentável vermos o governantes, mamadores de plantão, não mexer uma palha para impedir o avanço da retração que se manifesta dia-a-dia, mantendo-se impávido e sereno como se voasse em céu de brigadeiro e gastando em mordomias. 

O presidente Cavaco Silva queixa-se dos gordos salários que recebe: só pode estar de sacanagem com a população. E o primeiro-ministro Passos Coelho chama os portugueses de piegas. Isso é um achincalhe, é cuspir na cara do povo.

Com certeza nem um nem outro tiveram, nem terão, de devolver ao banco as casas onde moram. Na verdade, os que compõem o governo - todos pagos pelos impostos, aumentados recentemente -, estão preocupados, apenas, em salvar os seus futuros. A população que se lixe.

Não interessa se as pessoas não têm emprego, se têm de devolver os imóveis onde moram aos bancos por falta de pagamento de prestações, usar a rua como teto, e de mendigar comida. A fome, o aumento da miséria, o desemprego recrudescendo não sensibilizam nem Passos Coelho e seus ajudantes, nem o presidente Cavaco Silva. Que vergonha, senhores.

A população ir para as ruas destruir tudo o que encontrar pela frente, como ocorreu há dias em Atenas, não é a melhor solução, nem os portugueses têm tradição dessa prática. Manifestações gigantescas como a última realizada em Lisboa, Porto e várias cidades do país e movimentos grevistas são a grande arma do povo que pode levar à queda do governo e à realização de novas eleições.

O fato é que Portugal precisa, neste momento, de um governo composto de gente com compromisso nacionalista, uma relação verdadeira com o povo e uma visão muito clara do quadro real do país, antes que as coisas tomem o rumo da derrocada.

Portugal precisa de ajuda digna, justa da troika que leve investimentos e não recessão, que garanta o aquecimento do mercado, a reabertura das indústrias, a retomada dos empregos e uma política econômica externa firme e realista cortando a importação de itens que Portugal pode produzir. Gente que negocie com a troika sempre tendo como princípio a defesa dos interesses da nação e não dos banqueiros e da troika.

Está na hora da virada. Qualquer esforço nesse sentido vale a pena.

Arnaldo Moreira
Jornalista